“A economia capturou a política”, diz a professora Leda Paulani. Com outras palavras, o também professor Ladislau Dowbor reforça: “As finanças eram coadjuvantes para fomentar o processo produtivo. A política se submeteu”. A consequência desse chamado processo de financeirização da economia tem sido o crescimento da desigualdade. Em vários níveis e em escala global.
Em referência ao aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos, celebrado quinta-feira (10), o debate virtual, realizado anteontem (12), fez parte do chamado Sábado Resistente, evento promovido regularmente pelo Memorial da Resistência e pelo Núcleo de Preservação da Memória Política. Foi a última edição do ano. A mediação coube ao jornalista Luis Nassif, do jornal GGN.
Recursos existem
Apenas um pouco de redução da desigualdade já permitiria a toda família ter acesso a uma vida digna, diz Dowbor, fazendo algumas contas. “É organização política e social. Não é falta de recursos”, afirma. Durante os primeiros quatro meses de pandemia, 42 bilionários brasileiros aumentaram suas fortunas fortunas em R$ 180 bilhões. “Dá seis anos de Bolsa Família”, compara o professor titular do Departamento de Pós-graduação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).
Esses 42 são, basicamente, aplicadores financeiros. Não são ligados à produção. O processo de acumulação mudou. O capitalismo mudou. “É mais importante para o conselho de administração da Samarco repassar dividendos aos acionistas do que consertar o raio da barragem. O dividendo se torna mais importante que a produção”, constata Dowbor.
Professora do Departamento de Economia e da Pós-graduação da Faculdade de Economia da Universidade de São Paulo (USP), Leda Paulani usa outra imagem. As tesourarias, na indústria, concorrem com o próprio objeto social da indústria. Vale mais o ganho nos juros do que o investimento na produção. O próprio capital se transforma em mercadoria: “É a mercadoria absoluta”.
Algo próximo do totalitarismo, diz a professora. Uma economia controlando a política e controlada por grandes corporações. “Esse processo de centralização se dá sobre o domínio do capital financeiro. Destrói as liberdades e torna a democracia alguma coisa que é apenas uma formalidade. Não dá para falar em respeitar direitos humanos com totalitarismo de mercado.”
“Quando você domina a política, pode tornar legal o que não é legítimo”, aponta Dowbor. A desigualdade “explosiva” mina a democracia. Nos Estados Unidos, os 50% mais pobres não saíram do lugar. Aqui, além do desemprego e de apenas uma parcela no mercado formal, há 61 milhões de “negativados”, endividados, quebrando a capacidade de compra das famílias.
Quando ele fala em desigualdade, não é apenas de renda, observa. Mas educacional e de acesso à terra, por exemplo. O mundo segue distante de uma sociedade “economicamente viável, socialmente justa e ambientalmente sustentável”.
FONTE: RBA