A Feeac RS esteve presente, juntamente com representantes do Seeac RS, na audiência pública realizada na terça-feira, 22/10, que abordou o projeto “Enfrentamento às Fraudes nas Relações de Trabalho na Saúde”. A iniciativa é da Coordenadoria Nacional de Combate às Fraudes nas Relações de Trabalho (Conafret) do Ministério Público do Trabalho (MPT). O evento ocorreu no Plenário Milton Varella, no Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, em Porto Alegre.
A audiência contou, como expositores, com o procurador do trabalho e coordenador nacional da Conafret, Renan Bernardi Kalil; a procuradora do trabalho e vice-coordenadora nacional da Conafret, Priscila Dibi Schvarcz e a procuradora do trabalho e coordenadora regional da Conafret, Laura Freire. Além disso, Sônia Regina Coradini, representante do Conselho Regional de Enfermagem do Rio Grande do Sul (Coren-RS), apresentou dados do setor.
A primeira oradora da tarde foi a procuradora Priscila Dibi Schvarcz. Ela abordou a legislação que rege processos de contratação e terceirização. Também apresentou os principais problemas verificados com os contratos de tomadores de serviços terceirizados e que elementos devem ser levados em conta durante as contratações terceirizadas na saúde para que ela seja feita obedecendo aos critérios do ordenamento legal.
Ela também explicou os indícios que levam a concluir pela ilicitude na contratação de serviços terceirizados – como quando o contrato tem foco no elemento humano, e não no resultado do serviço, como deveria ser nos contratos legítimos. Ela também abordou outras questões urgentes do tema, como o fenômeno da pejotização e o desvirtuamento da figura do MEI.
“O MEI o que é? O MEI foi criado para que um profissional efetivamente autônomo pudesse ser formalizado e ter inclusão previdenciária. O que estamos vendo hoje no Brasil? O MEI sendo usado como subterfúgio para fraudar vínculo de emprego. Apenas entre 2021 e 2022, houve cadastramento de mais 1,5 milhão de MEIs no Brasil, sendo que, segundo o IBGE, 28% estão cadastrados no CADUnico, demonstrando a precarização desse grupo de trabalhadores. O MEI não pode ser utilizado para fragilizar relações de trabalho”, afirmou a procuradora.
Ela também abordou o quanto algumas configurações de contratação têm sido feitas contrariando as próprias disposições legais para profissionais da saúde.
“Na lei que regulamenta a profissão de enfermagem, em seu artigo 15, está estabelecido que as atividades de técnico de enfermagem e auxiliar de enfermagem, quando exercidas em instituições de saúde, públicas ou privadas, e em programas de saúde, somente podem ser desempenhadas sob supervisão de enfermeiro. Logo, são funções que não são compatíveis com o caráter de profissional autônomo” – exemplificou.
O procurador do trabalho Renan Bernardi Kalil foi o orador seguinte. Em sua exposição, iniciou explicando o regime geral das relações de trabalho no Brasil, distinguindo as relações que são definidas pela subordinação e pela autonomia. Posteriormente, o procurador falou sobre o funcionamento adequado de cooperativas e como elas vêm sendo usadas para fraudar relações de trabalho.
“O uso fraudulento de cooperativas chegou na Organização Internacional do Trabalho, que editou uma recomendação, a de número 193, que diz expressamente que as cooperativas não devem ser usadas para fraudar uma existente relação de emprego.”, disse o procurador Renan.
Ele prosseguiu diferenciando as cooperativas de produção e serviço, ao explicar que não existem cooperativas voltadas para oferecer mão de obra. “Não é possível falar de uma cooperativa de mão de obra que seja lícita”, o procurador define. Também falou sobre a natureza democrática das cooperativas, o que as difere do resto.
“A cooperativa é uma organização com características fortemente democráticas, algo que não temos em empresas tradicionais, com o objetivo de que todas as pessoas possam influir nos rumos da cooperativa para que todos ganhem neste processo”, afirmou.
Na sequência, a Coord Regional da Conafret, Laura Fernandes, fez a sua exposição, abordando as questões práticas relativas ao projeto institucional “Enfrentamento às Fraudes nas Relações de Trabalho na Saúde”, da Conafret regional, sob sua titularidade.
Ela também explicou as consequências para o trabalhador das relações de emprego fraudadas:
“O aumento da exploração da força de trabalho, a partir do momento que a gente afasta o vínculo de emprego, faz com que o contratante tenha maior liberdade para explorar o trabalhador”, afirmou a procuradora. Também disse que, em um cenário de ampla precarização, a dupla jornada se torna necessária para complementação de renda, levando o trabalhador a ter um desgaste físico e mental.
A procuradora destacou o papel do estado na precarização das relações de trabalho, especialmente ao permitir contratos de terceirização mal formulados e sem fiscalização, o que gera um número expressivo de processos trabalhistas no futuro. Segundo ela, as falhas da terceirização geram prejuízos ao erário público.
“Se a administração pública contrata a um preço inviável de ser executado pela empresa contratada, que não cobre os custos de uma relação de emprego, a Administração Pública está sendo conivente com essa fraude, desde antes do início deste contrato, havendo nítida culpa in eligendo. A administração pública está contribuindo pela concorrência desleal e o dumping social”, explica a procuradora.
Na sequência, houve a manifestação da conselheira-secretária do Coren-RS, Sônia Regina Coradini, que apresentou algumas considerações sobre a questão da terceirização pelo ponto de vista dos profissionais de saúde, além de dados da categoria profissional.
“A terceirização, mesmo que seja legal, estabelece uma diminuição da qualidade do atendimento. Ela cria essa possibilidade de fazer a substituição de um profissional por outro e nos leva a pensar: aquele profissional que entra para substituição temporária, ele vai estar embasado, vai ter o conhecimento necessário? Esse questionamento nos leva a colocar que é importante que possamos, dentro das nossas instituições, fiscalizar e trazer elementos para que se possa compreender o que esse fenômeno significa para o atendimento da população.
Na parte final da reunião, foram feitas considerações por parte da audiência. A partir disso, os procuradores responderam perguntas feitas pelo público.
A vice-procuradora-chefe do MPT-RS, Martha Diverio Kruse, representou a instituição na mesa de abertura do evento. Em sua saudação, ela agradeceu a parceria constante do TRT-4 em ações do MPT-RS. Também celebrou a realização do evento, como parte da atividade da instituição para garantir a própria lisura em um sistema econômico
“O enfrentamento massivo das fraudes em um setor econômico contribui para o tratamento isonômico, para a garantia dos direitos sociais dos trabalhadores, mas não apenas isso. Evita, também, a concorrência desleal e o dumping social, pois impede que as empresas que cumprem a lei sejam compelidas a concorrer com as que fraudam a lei e obtêm condições artificialmente mais lucrativas, às custas da sonegação de direitos”.
Também participaram da mesa de honra do evento o vice-presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, desembargador Alexandre Corrêa da Cruz, representando a corte e o chefe da Seção de Segurança e Saúde no Trabalho da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego no RS, auditor-fiscal Sérgio Augusto Letizia Garcia.
Fonte e fotos: PRT4.MPT.MP.BR