Na manhã desta quinta-feira (14), a Comissão de Segurança, Serviços Públicos e Modernização do Estado promoveu audiência pública para tratar da precarização dos serviços terceirizados nos órgãos públicos das três esferas. A proposição foi do SEEAC Porto Alegre e da FEEAC RS, e a condução do debate foi do deputado Jeferson Fernandes (PT). Ao final, ficou acordada a instituição de um grupo de trabalho para seguir tratando do assunto.
Jeferson explicou que o objetivo da audiência, além de ouvir sobre os problemas enfrentados pelos trabalhadores das empresas terceirizadas, era buscar soluções. Disse que o que motivou a proposição do debate foi o recente caso na Assembleia Legislativa envolvendo a empresa responsável pela portaria, que deixou os trabalhadores sem pagamento e, com isso, teve seu contrato rompido. Uma nova empresa foi chamada para assumir o serviço, contratando os mesmos funcionários que já atuavam na função há mais de quatro anos na Casa, mas os pagamentos e benefícios que não foram pagos pela empresa anterior, incluindo a rescisão contratual, seguem em aberto. O parlamentar informou que a administração da ALRS foi convidada a participar do debate, mas não enviou representantes. “Lamentavelmente, não tenho como justificar e explicar o inexplicável”, disse aos funcionários terceirizados que acompanhavam a audiência no Espaço da Convergência.
Duas funcionárias terceirizadas relataram aos presentes que 34 pessoas estão há um mês e quinze dias sem receber salário, vale transporte e vale alimentação, além de não saberem se receberão o que têm direito na rescição dos contratos. “A empresa já vinha há muito tempo apresentando problemas, por que não viram isso antes?”, questionou uma delas. Elas também falaram do medo que esses trabalhadores têm para denunciar esta e outras situações porque pode haver retaliação das empresas e eles acabarem perdendo seus postos de trabalho.
Entre as pautas a serem tratadas no grupo de trabalho, conforme sugeriu Jeferson, estão a realização de cursos e treinamentos para quem atua nos setores de edital das licitações e fiscalização dos contratos nos órgãos públicos; a instituição de um selo para as empresas que cumprem suas obrigações; a criação de um canal de denúncia para que os trabalhadores não precisem se expor; a discussão sobre uma conta vinculada ou criação de fundo para que os recursos das multas sejam utilizados para pagamento dos trabalhadores caso necessário. O parlamentar ainda se comprometeu a levar o assunto para a Mesa Diretora e o presidente Valdeci Oliveira (PT) e solicitar uma resposta sobre a situação do caso na ALRS.
Manifestações
O representante do SEEAC Porto Alegre, Francisco Rosso, lembrou que é preciso mudar a cultura de olhar os trabalhadores terceirizados como postos de trabalho. “Eles não são números, são pessoas que precisam e dependem de empresas terceirizadas mal intencionadas, que ganham licitações e, depois de algum tempo, não pagam salários e benefícios e somem, deixando para trás os trabalhadores desamparados”, afirmou. Na sua avaliação, o Estado não se importa com o que vem acontecendo, já que empresas que tiveram seus contratos rescindidos em alguns órgãos por esses problemas acabam ganhando novas licitações para prestar o serviço em outros departamentos ou setores. Ele criticou a conduta da ALRS em relação aos trabalhadores no caso que motivou a audiência pública. “O Estado está preocupado com a prestação do serviço e não com os trabalhadores”, destacou.
Também advogado do SEEAC Porto Alegre, Evaristo Heis, citou que alguns órgãos da esfera federal já retêm a fatura para poder pagar os trabalhadores em casos como o da ALRS, o que não ocorre com frequência nos órgãos estaduais. Ainda salientou que muitas empresas e órgãos federais são parceiras do sindicato e relatou a dificuldade de isso também ocorrer no setor público estadual.
O presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, Francisco Rossal de Araújo, informou que a terceirização tanto no setor público quanto no privado gera um número imenso de reclamatórias trabalhistas. Em relação ao aspecto administrativo da questão, ele explicou que o órgão público deveria estar ciente de que, quando faz a terceirização de um serviço, é preciso tomar uma série de precauções ou salvaguardas, instituindo esses mecanismos nos editais. Além disso, lembrou que o ente público tem o dever de fiscalizar os contratos e que, em geral, as empresas com dificuldades vão dando sinais, como o atraso de salário, o não pagamento de férias e 13º salário. Já em relação à responsabilidade trabalhista, citou que o Supremo Tribunal Federal já se manifestou que o ônus da prova é do empregado e não do empregador. Por isso, sugeriu que trabalhadores e sindicatos tomem algumas medidas para conseguir documentos que comprovem o inadimplemento quando ocorrer.
A diretora de Logística do Tribunal de Justiça do RS, Ana Paula Zacarias, disse que o órgão sempre atua em busca de medidas peventivas. Informou que há 2002 funcionários terceirizados no poder e que, pelas medidas tomadas previamente, o índice de problemas é de apenas 1%. Segundo ela, quando se realiza a licitação é imprescindível que a administração preste atenção na qualificação técnica e econômico-financeira da empresa. “Não podemos permitir que empresas aventureiras ganhem a licitação”, declarou. Ainda citou os cuidados na pesquisa de preço, ainda na fase interna da licitação, e na gestão e fiscalização do contrato. Disse que, em caso de problemas com as obrigações da empresa, os valores a serem pagos pelo órgão têm como prioridade o pagamento direto aos terceirizados.
O diretor do Sindicato dos Trabalhadores da Justiça Federal do RS, José Carlos Pinto de Oliveira, criticou a reforma trabalhista realizada no país, defendendo sua revogação. Na sua avaliação, a reforma precarizou ainda mais as relações de trabalho, principalmente para os terceirizados. Defendeu ainda a busca da responsabilização dos órgãos públicos e a necessidade de um compromisso desses órgãos com os trabalhadores.
O coordenador regional da Coordenadoria Nacional de Combate às Irregularidades Trabalhistas na Administração Pública do Ministério Público do Trabalho do RS, Marco Aurelio Cordeiro da Cunha, fez um breve relato de sua experiência anterior, atuando no estado do Piauí, especialmente em relação às prefeituras, onde celebravam termos de ajuste de condutas. Segundo ele, esses documentos eram completos, prevendo todas as salvaguardas comentadas pelos demais participantes. Ele ainda informou que a grande dificuldade do Ministério Público do Trabalho é a fiscalização, pela falta de pessoal. “Precisamos que as demandas cheguem ao nosso conhecimento”, disse, pedindo apoio aos participantes para que, em caso de denúncias, procurem o órgão.
A superintendente da Unidade de Contratações e Pagadoria do Banrisul, Mirceia Ramos, apresentou atuação semelhante à do TJ/RS em relação à contratação de empresas terceirizadas. Informou que há 3 mil trabalhadores terceirizados atuando na instituição e o índice de problemas nos contratos também seria de 1%. Esclareceu que não é preciso uma grande estrutura para fazer a fiscalização administrativa dos contratos, informando que no banco a equipe responsável por esse serviço é formada por dois servidores e dois estagiários. Ainda falou que, para evitar pressões sobre os terceirizados, mensalmente alguns são sorteados aleatoriamente para informarem se as obrigações da empresa estão sendo cumpridas.
Já o presidente da FEEAC RS, Henrique Silva, classificou como trabalho escravo o que se faz com os terceirizados que seguem desempenhando suas funções mesmo sem receber salários. “Precisamos trabalhar um contrato de edital protetivo”, defendeu, criticando o fato dos órgãos públicos só multarem as empresas que descumprem suas obrigações contratuais e deixarem os trabalhadores desamparados. Sugeriu também a instituição da conta vinculada, onde um percentual a ser pago à empresa ficaria guardado para usar quando surge esse tipo de situação. Ainda informou que a entidade irá construir uma cartilha de orientação para todas as questões envolvendo a terceirização no setor público.
Também se manifestaram Luciane Mancuso, pelo Departamento Administrativo da Superintendência dos Serviços Penitenciários, que relatou que está sendo estruturado um curso de capacitação para os servidores que atuam na fiscalização dos contratos de serviços terceirizados; e o vereador de Porto Alegre Jonas Reis (PT), que denunciou casos de precarização dos serviços terceirizados em órgãos do município. Ainda participaram da audiência representantes do Badesul, Hospital Sanatório Partenon, sindicatos, entre outros.
FEEAC RS com base nas informações AGÊNCIA DE NOTÍCIAS DA AL RS
Foto: Celso Bender